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Hoje completa um mês desde que vi Barbie nos cinemas. É fácil lembrar a data porque foi no fatídico dia em que acordei com meu LinkedIn hackeado.
Como não tinha muito o que fazer naquele momento, uma distração cabia muito bem e todo o caos de perder o perfil acabou ajudando a convencer a Luísa, minha namorada, a ver o filme. Desde a estreia, eu vinha tentando. Sem sucesso.
E como o filme estava muito em alta, as expectativas e as impressões foram afetadas por tanta gente falando da Barbie.
Agora, o que fica depois que a poeira do hype baixou e o mundo deixou de se vestir de rosa?
Antes de qualquer coisa, um exercício.
Tente tirar do contexto 2023 e, por alguns instantes, esqueça o fenômeno Barbie que tomou conta do mundo.
Alguns anos atrás, se alguém dissesse que um filme da boneca da Mattel seria lançado, o que você imaginaria?
Me arrisco a dizer: algo bem artificial, com toques cartunescos, flertando com o ridículo e que entregaria pouco além de uma longa propaganda da própria boneca.
Talvez, algo nos moldes daquele Batman & Robin dos anos 90 com George Clooney, que não passou de uma propaganda para vender bonecos e um filme que parecia voltado para o público infantil.
Agora, de volta a 2023.
Faz um mês que vi o filme e, desde então, as principais críticas negativas que tomaram conta da internet sobre o filme costumam vir de dois extremos:
uma parcela do público masculino que se recusa a ver um filme da Barbie com toques feministas e com algumas intenções de cancelar o filme, inclusive;
algumas pessoas condenando o filme por ser raso demais ao abordar temas como feminismo e patriarcado.
Para incomodar esses dois extremos, é sinal que o filme fez algo muito certo e, talvez, tenha cometido um único pecado.
Um pecado que, hoje em dia, nem sei se merece esse nome.
Barbie acertou tanto a mão no marketing que o filme ganhou um hype e criou expectativas absurdas. De repente, o mundo estava tomado por rosa e o filme que parecia propaganda de boneca ganhou proporções inimagináveis.
Em números, foi a maior estreia para uma diretora na história e sua pré-venda do filme superou “Avatar: o caminho da água”, uma sequência muito aguardada desde a megaprodução de 2009.
E quando digo que o excesso de divulgação pode ter sido um pecado, tem dois motivos:
Alguns momentos icônicos do filme foram entregues de bandeja, para levar mais pessoas para as salas de cinema. A abertura inspirada em “2001: uma odisseia no espaço” é ótimo exemplo de spoiler;
Diante das expectativas que o próprio filme criou no público, muitas pessoas foram para o cinema esperando algo extraordinário.
De repente, para alguns, Barbie se tornou o filme que deveria destruir o patriarcado e ensinar todas as nuances do feminismo para gerações mais tradicionais e para as novas gerações que fossem aos cinemas.
Foi essa a responsabilidade que o longa-metragem ganhou quando algumas pessoas compraram o ingresso para assisti-lo.
Agora, para mim, o grande acerto de Barbie entra em dois pontos.
Primeiro, o filme entende todos os problemas que poderia ter ao contar a história de uma boneca que representa um símbolo de consumo e um idealismo de padrões de beleza feminino.
Depois, entrega com simplicidade tudo o que ele se propõe a fazer.
Barbie tem, sim, um tom bem artificial, mas uma artificialidade autêntica que a diretora Greta Gerwig buscou inspiração em filmes como “O Mágico de Oz”.
Também tem seus toques cartunescos e flerta bastante com o ridículo, mas faz tudo isso de forma consciente — diferente do Batman & Robin dos anos 90.
Essa consciência permite que o filme não se leve a sério nos momentos certos e isso ajuda a expor ao ridículo algumas situações.
A artificialidade autêntica ajuda a estabelecer as regras da Barbielândia e o contraste com a realidade coloca em pauta as principais questões da idealização dos padrões de beleza femininos.
Se alguém foi para o cinema com intenção de condenar o filme por efeitos negativos da boneca na autoestima feminina, essa pessoa foi logo desarmada.
E mesmo com a Barbielândia idealizada como um mundo perfeito de brinquedo, uma das cenas mais cartunescas acontece no ambiente corporativo, em nosso mundo. Não é por acaso.
Outro ponto que não é mero acaso são os personagens masculinos.
Você se lembra de algum outro filme retratar homens de forma tão infantilizada e superficial?
Esse deboche fortalece a discussão sobre o patriarcado no filme e ainda traz uma espécie de vingança.
Depois de milhares (milhões?) de personagens femininas escritas por homens em versões superficiais, sexualizadas e objetificadas, estamos falando de um filme escrito, dirigido e produzido por mulheres.
O simples fato disso ter ofendido algumas pessoas é prova que o ego masculino é mesmo frágil e só enriquece a discussão que o filme levanta.
Greta Gerwig conseguiu entregar tudo isso numa simplicidade tão grande, que o filme consegue transitar entre o musical, o drama existencial e a comédia de forma bastante natural.
Feliz mesmo foi quem soube driblar o hype criado para sentar na cadeira com sua pipoca sem grandes expectativas.
E para quem detestou Barbie, uma péssima notícia.
É um sinal claro para a indústria do cinema: um brinquedo, uma bela narrativa e uma estratégia de marketing bem executada transformaram uma boneca em um fenômeno cultural, em um sucesso estrondoso de bilheteria.
Imagine o impacto disso a longo prazo.
Especialmente agora que os filmes de super-herói parecem ter cansado o público, acredito que veremos uma série de outros filmes baseados em brinquedos icônicos.
Barbie é só o começo.
Um convite
No dia 11/09, às 19:30, teremos um aulão gratuito: "Além da Narrativa e das fórmulas prontas".
Para montar essa aula, vou trazer muitos conteúdos de palestras e treinamentos.
A proposta é trazer o essencial para você aprender como colocar sua voz em seus próximos textos, para transformar sua escrita e suas histórias em verdadeiros diferenciais — sem depender de qualquer tipo de template.
Tô bem animado com o que comecei a estruturar por aqui e acredito que você também vai gostar.
Posso te esperar no dia 11?
Um abraço e até breve,